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Notícias

22/05/2025 - In Memoriam

Padre José Joaquim Pillon (1928-2017)

1.  Introdução

“Escrever é um jeito de rezar. Escrevo melhor depois de ter rezado. Quando escrevo parece que estou mais perto de Deus.” (Pe. José J. Pillon).

 O Pe. José Joaquim Pillon, nasceu no dia 12 de junho de 1928, em Arroio Grande, Santa Maria (RS). Em um de seus livros ele escreve: “Nasci de noite, assim como todas as crianças do meu tempo, em casa, naquele mesmo colchão onde haveriam de nascer mais 1 irmãos, todos pelas mãos de uma parteira” (PILLON, José Joaquim. Sem medo da verdade: alegrias, tristezas e esperanças de um padre. Ariquemes (RO): [s.n], 2011. p.

36). Pe. José era filho de Antônio Pillon e Maria Marconatto, e, sobre seus pais, escreveu: “Minha mãe, era mulher bonita de corpo e alma. Muito carinhosa e serena. Um contentamento alegre e sossegado brilhava em seus olhos, tornando seu rosto macio e rosado. Nem os doze filhos que saíram de seu ventre, nem os infindos trabalhos domésticos conseguiram enrugar sua pele e desbotar o colorido róseo de seus lábios. Já papai era alto e magro, mas muito forte e saudável. Seu rosto era muito angular, enquanto o olho direito puxava estrabismo. Era 10 anos mais velho que mamãe” (Idem.p. 37). Na família outros dois seguiram a vida religiosa, o Pe. Vicente e a Irmã Mara, ambos Palotinos.

2.  Vocação

O Pe. José deseja muito ser médico, mas a religiosidade familiar, a presença do padre André Ferrari e dos missionários Celestino Trevisan e Rafael Pivetta, o motivaram a seguir a vida sacerdotal. Em 1942 foi para o Seminário Raínha dos Apóstolos em Vale Vêneto (RS), onde fez os estudos primários e ginasiais. Ele mesmo narra a viagem: “em 1942, papai encilhou dois cavalos e partimos, alta madrugada, rumo ao seminário de Vale Vêneto” (Informações Palotinas, n. 2, jul/dez 2006). Ao se referir ao seminário ele escreve que “os educadores não mediam esforços para que o internato se tornasse um lugar de alegria, promovendo esportes, festinhas, passeios, teatros, entremeados de estudos e orações, com uma espiritualidade que nos ligava fortemente a Cristo e à Virgem Maria, fazendo-nos esquecer a família e o mundo”(idem. p. 67). O noviciado, Pe. José realizou em Cadeado, hoje Augusto Pestana (RS), no ano de 1949. Em seus escritos ele recorda um fato interessante: Depois de oito dias de retiro, com mais 15 colegas, trocamos o terno secular pela veste religiosa. A batina preta significava distanciar-se do mundo para pertencer só a Deus” (idem. p. 76). Já os cursos de Filosofia e Teologia realizou de 1950a 1957, no Seminário Maior de São João do Polêsine (RS): “Passei três anos estudando filosofia em velhos e surrados manuais. Nossa biblioteca não era apenas pobre, mas paupérrima. Como era pobre a filosofia, no meu tempo de estudante! E dizer que, alguns anos mais tarde, eu seria professor universitário de filosofia, pelo espaço de 50 anos. Tornou-se minha ciência predileta” (idem. p. 80-81.) Naquela época o curso de teologia era realizado em quatro anos e sobre isso ele diz: Todo conteúdo estava codificado em manuais que repetiam fielmente as doutrinas do Concílio de Trento” (idem. p. 83). O Pe. José fez a sua primeira consagração na Sociedade do Apostolado Católico, no dia 2 de fevereiro de 1951, sendo que a ordenação presbiteral aconteceu no 2 de dezembro de 1956, aos 27 anos juntamente com mais 8 colegas, tendo por bispo ordenante Dom Luiz Victor Sartori. Ao falar de sua ordenação, Pe. José declara: “eu escolhi, acreditando”. E vale ainda lembrar que “aquele que escuta a voz do Senhor deve saber que será chamado a uma aventura cujo final não pode calcular, porque está na mão de Deus” (Thomas Merton).

3.  Estudos

Em 1958 fez pós-graduação em Filosofia, na Pontifícia Universidade Católica (PUC) em Porto Alegre (RS). Nos anos de 1964 e 1965, estudou Pastoral Catequética no Instituto Católico, em Paris, França. A princípio, Pe. José foi para a Bélgica, mas não conseguiu vaga. Então foi para Paris e matriculou-se na Sorbonne, como a orientação era neo- cartesiana, não gostou e não era o que esperava. Ouvindo as palestras nas paróquias dos Padres Conciliares como Chenu, Congar, Daniélou, Boulard e outros, e, sabendo que alguns davam aulas no Instituto Católico de Paris foi ouvi-los. E foi ali, ouvindo Congar e Daniélou, que surgiu a ideia de fundar um Instituto de Pastoral Catequética, em Santa Maria/RS. Escreveu uma carta aos colegas do Colégio Máximo, propondo a ideia e pedindo ajuda. A resposta foi positiva e incentivadora. Foi o bastante para se desvincular da Sorbonne e passar para o Instituto Católico para se aprofundar nos estudos de pastoral em vista de uma eclesiologia renovada.

4.  Apostolado

Ao chegar a Santa Maria foi reintegrado à comunidade do Colégio Máximo Palotino, onde já havia sido reitor (1960-1963) e professor de História da Filosofia, História da Igreja e Teologia Pastoral. Dirigiu (1966-1974) e lecionou no Instituto Diocesano de Pastoral Catequética e fundou a cadeira de Filosofia da Arte na Universidade Federal de Santa Maria. Em muitos fins de semana, ministrou cursos de Catequese Renovada em diversas dioceses, tais como Santa Cruz do Sul, Pelotas e Frederico Westphalen. Pe. José foi eleito Provincial em dois períodos (1969-1974) e tinha por lema a seguinte máxima “Por uma Província unida, renovada e apostólica” (Informações Palotinas, n.2, jul/dez. 2006, p. 165). Junto ao Conselho Provincial trabalhou na implantação e consolidação das Comunidade Regionais; encontro anual de Vale Vêneto com a participação de todos, onde se definiam as prioridades de trabalhos; cursos de renovação, em dois anos todos os confrades passaram por eles; abertura e consolidação da Missão na Amazônia e equipe econômica para fortalecer a economia da província. Depois de seis anos de provincial, fundou a paróquia Santo Antônio, no Patronato, e ali trabalhou de 1976 a 1982. Entretanto, apesar de seu imenso trabalho no Rio Grande do Sul, o seu desejo era trabalhar na Amazônia. Por isso, em 1983 foi para lá e assumiu a Paróquia São Luiz Gonzaga, em Porto Velho. Ele descreve que “a pobreza era grande… na minha paróquia estava o maior hospital e o maior presídio do Estado da Rondônia. Semanalmente visitava os doentes e os detentos. Lecionava História da Filosofia e Antropologia no Seminário Maior Diocesano” (Idem, p. 166 e 167). Em 1989 foi para Ariquemes (RO), para trabalhar na construção e direção do Centro de Formação São Francisco de Assis, onde trabalhou durante 16 anos na programação de cursos. Foi também membro do Conselho de Saúde, fundou e dirigiu uma escola de Enfermagem para a Prefeitura, onde se formaram muitos profissionais para os hospitais da região. Dirigiu, por diversos anos, a Faculdade de Naturopatia. Lecionou Introdução à Filosofia, Antropologia e Ética na Faculdade de Pedagogia, Geologia e Biologia Evolutiva no curso de Ciências. Foi muitas vezes convidado a dar palestras sobre Ecologia e Ciências Ambientais em várias instituições. Desde que descobriu a Floresta Amazônica se apaixonou pela natureza e seu Criador. Ele dizia: “Não há outro lugar onde a vida irrompa com tanto vigor” (idem. p. 168).

5.  Escritor

“Escrever é um jeito de rezar. Escrevo melhor depois de ter rezado. Quando escrevo parece que estou mais perto de Deus. Alinhar palavras tem mais sabor de eternidade do que pronunciar palavras, emitir sons que facilmente se perdem no ar.” (idem, p. 171). O Pe. José vê na escrita uma obra de arte esculpida: “um livro é como uma escultura em pedra, nem o tempo destrói” (id.ib). Ele escreve para partilhar as verdades que descobriu e que o fizeram feliz. Para ele o momento de maior emoção foi quando alguém o chamou de escritor. Escreveu vários livros: Amazonia, último paraíso da terra; Os encantos da vida; Sem medo da verdade: alegrias, tristezas e esperança de um padre (2011); A árvore que escondia os segredos de Deus (2014); A Esperança (2016). Ao se referir sobre o livro Encantos da Vida, ele nos diz o seguinte: “tento mostrar, na primeira parte, que, ao descobrirmos Deus como um tesouro, tudo muda na vida da gente. Andar tateando o mistério do amor infinito de Deus já é uma descoberta maravilhosa. Deus é o maior tesouro, a felicidade suprema. Na segunda parte, o Amor de Deus, sua beleza, sua Vida, estão encarnados nas suas criaturas. Desde que o mundo foi criado, Deus está encarnado nele. O Evangelho segundo João liga a Criação à Encarnação: no princípio era o Verbo… nada foi feito sem Ele… (Jo 1,1). Descobrir esta presença do amor, da beleza do Verbo, ouvir seus passos andando no meio dos seres seus filhos, ver o sorriso de Deus pela alegria de ter criado o mundo, não está aí a felicidade e os encantos da Vida?” (id.ibid. p. 169- 170). O Pe. José sempre dizia que não era um homem de um livro só. Lia todos os que estivessem ao seu alcance, novos e velhos. Pe. José gostava tanto de ler que a Biblioteca Municipal de Ariquemes (RO), conferiu-lhe o título de o maior leitor de seus livros nos últimos 20 anos.

6.  Poeta

Os seus escritos estão cheios de poesia, mas nos últimos tempos ele dedicou um poema muito especial à grande Mãe Maria que sempre o amparou quando as trevas lhe cercavam.

Ave, Santa Mãe, Maria!

Ainda pequeno, no colo da mãe, sem saber, eu te amava. Muitas vezes, mil vezes talvez, mamãe me dizia:

– Reza, filhinho, à mãe lá do céu: Ave Maria.

E, vendo o sorriso nos lábios da mãe, balbuciava com ela:

Ave Maria, cheia de graça, mulher tão bendita, Mãe de Jesus! Fui crescendo e sonhava povoar este mundo de paz e de amor Meus segredos, bem sabes, eram a ti que eu sempre confiava.

Um dia, ouvi uma voz que dizia: Vem, a messe é grande, falta operário! Correndo, tomado de susto, levei-te a notícia que ouvi.

Olhei nos teus olhos e vi que teus lábios diziam que sim. Com muito amor e paixão segui o chamado do Mestre, Anunciando a palavra da vida, servindo os irmãos.

Estrela do mar, tu guiaste meu barco nas noites escuras. Nas horas difíceis eu sempre olhava teu rosto.

E tu acenavas, dizendo: segue adiante, é este o caminho! Segue adiante, não temas; as ondas sempre alcançam a praia. Nem há noite tão longa que não chegue a luz da aurora.

Graças a ti, Mãe querida, Jamais desisti, confiando na ajuda que nunca faltou. Por isso sou grato e sempre me lembro de ti.

Agora, já vejo brilhar no horizonte um Tesouro de imenso fulgor. E isto sinto que os sonhos não foram pura e fugaz ilusão.

Ao longe, vem surgindo a terra bonita, da paz infinita, morada do amor. Chegar bem perto de ti, ficar ao teu lado, sob o olhar de Jesus.

É tudo o que sempre esperei, acreditando nas promessas que outrora ouvi.

 7.  Despedida

Havia um grupo de pessoas, dentre as quais enumeramos os familiares do Pe. José, destacando sua mana a Irma Mara, da Congregação Palotina, pessoas da comunidade de Fátima do Sul e os PP. Vanderlei Cargnin, representando o Conselho Provincial, Geraldo Werle que acompanhou o corpo, desde Campo Grande, Ademir Alves Moreira, Ládio Girardi e Valmor Domingos Righi. Os padres presentes, em sua maioria, e a Irmã Mara partilharam sentimentos a respeito do momento de despedida que estavam vivenciando.

Pe. Vanderlei, em nome do Conselho Provincial, agradeceu a importante presença do Pe. José na comunidade palotina, como educador, professor, provincial e, por muitos anos, junto ao trabalho pastoral realizado na Rondônia.

 Pe. Geraldo Werle, que esteve muito próximo do Pe. José, na Rondônia e, de um modo muito bonito, nos seus últimos dias de vida, em Campo Grande, colocou em comum interessantes e derradeiras recomendações do Pe. José, quando ainda consciente.

Pe. Valmor, enalteceu o quanto o Pe. José tem amado a natureza, principalmente, defendendo, por vários escritos, seu valor e preservação. Deus coroou seus últimos dias de vida justamente quando a Igreja, pela Campanha da Fratenidade, pedia aos cristãos e ao mundo que peidassem bem da Obra da Criação, amando e respeitando nossa Casa Comum, a Mãe Terra.

Pe. Ládio, recordou o quanto o Pe. José tinha sido um pai em sua vida, de um modo particular, quando ficou padre e foi indicado para trabalhar na Missão do Mato Grosso do Sul, em Vicentina.

E, por fim, a Irma Mara disse que sempre se sentiu honrada pelo seu mano Pe. José, agradecendo a Deus e aos padres e irmãos palotinos pela permanente acolhida do Pe. José em sua comunidade. Com emoção rezou pedindo a Deus Pai que, como prêmio, desse ao seu irmão uma linda floresta no céu. 

Tudo foi simples, humilde, pequeno, modesto, silencioso, como se estivéssemos em meio à mata virgem e sob a chuva. Mas não deixou de ser um momento de profunda oração comunitária.

Louvemos ao Senhor por tudo aquilo que o Pe. José foi para nossa comunidade palotina, rezando também para que tenha o merecido prêmio e o descanso junto do Pai, na eternidade.

8.  Conclusão

Ao comemorar os seus 50 anos de sacerdócio, o Pe. José testemunhou: “amo por demais o sacerdócio, a Igreja e minha Comunidade Palotina”. Disse mais: “gosto de ser sacerdote, mas na práxis de Jesus, mais vinculado ao povo, mas profético e missionário e menos ligado aos ritualismos do templo, onde há muito incenso, mas pouco oxigênio.

E é de oxigênio que a vida necessita. Não há nada mais importante do que sentir-se filho de Deus, sentir-se amado por Ele e, também sentir-se chamado para amar e servir os homens, as plantas, a água, os animais, a terra inteira. Sinto-me feliz neste caminho. Tentei fazer o que pude. O meu sonho é juntar-me a Deus, encontrar-me com meus pais na eternidade” (id. Ibid. p. 172-173).

No dia 21 de maio de 2017, domingo, no silêncio da madrugada, na cidade de Campo Grande (MS), o Pe. José Joaquim partiu para a Casa do Pai, aos 88 anos 11 meses e alguns dias. Destes, viveu 66 anos como consagrado na Sociedade do Apostolado Católico e 60 anos como presbítero da Igreja.

Partiu serenamente como desejava e foi juntar-se a Deus. Neste mesmo dia enquanto os céus derramavam bênçãos sobre as terras sul mato-grossenses, ao entardecer, quase noite, o corpo do Pe. José foi sepultado no Cemitério Municipal de Fátima do Sul, onde se encontra o túmulo dos Padres e Irmãos Palotinos.